domingo, 2 de setembro de 2012

Febre - Introdução e Parte I

Oi, gente! Hoje eu tirei o dia para escrever um conto que me brotou na cabeça. Ele ficou grande demais para um Blog, portanto devo postá-lo em três ou quatro partes e aí vocês vão lendo com calma. Espero mesmo ver comentários ali embaixo, uma vez que contos são muito mais importantes para mim do que posts num blog, OK? E, claro, espero que gostem dessa joça.

:)


Febre - Parte I


            “Febre do Cubículo”. A chamada “Febre” ou “Síndrome do Cubículo” nada mais é do que um desses tipos modernizados dos clássicos problemas de histeria e stress. Eu estou estressado, não estou com “Febre do Cubículo”. Por mais que o psicólogo tenha tentado explicar a origem do termo, a razão pela qual meu problema se difere de qualquer outro tipo de desgaste psicológico não consegue entrar na minha cabeça. É claro que eu estou cansado do meu escritório e do meu estilo de vida. Quem não estaria, afinal? Mas daí a inventar uma nova síndrome para aqueles que, como eu, sentem vontade de enfiar os minigrampeadores de mesa pela traqueia daqueles a sua volta e apertar o botão ejetor até que todos os grampos tenham se acabado... Isso não faz nenhum sentido.
            Acho que é uma tendência da psicologia moderna... Como os estudos avançam mais rápido do que a capacidade das pessoas para inventarem doenças realmente novas para si, eles acabam tendo de setorizar e burocratizar as síndromes já existentes, tratá-las como entidades separadas, estudá-las a fundo e até a exaustão. Acabam tendo de explicar porque jornalistas e corretores de impostos e programadores sofrem da “Febre do Cubículo”, enquanto motoristas de ônibus sofrem da “Síndrome do Volante”, geneticistas sofrem da “Síndrome do Laboratório Apertado” e neurocirurgiões sofrem da “Febre da Sala de Lobotomia Transorbital”. Será que essas síndromes compartimentalizadas também sofrem da febre do cubículo? No fundo, acho que somos todos um bando de desesperados, tentando rotular o desespero uns dos outros.
            A questão é que eu estou aqui, na minha saletinha de meio metro cúbico no escritório do Jornal e, apesar da mente extremamente dialética ao analisar a “Síndrome do Caralho a Quatro”, não consegui digitar uma palavra sequer da minha crônica. Logo essa crônica. Logo uma crônica de despedida antes da licença médica, durante a qual eu devo tentar relaxar de verdade, e não apenas recair em algum dos vícios de sempre, como uma tentativa autolimitada de aliviar o estresse: Não devo ficar jogando pôquer online e perdendo, bit por bit, meu salário de cronista (que não é nem freelancer e nem um funcionário de verdade). Não devo ficar assistindo vídeos de pornografia, mostrando mulheres que eu nunca teria a capacidade de agradar beijando outras mulheres que eu nunca teria capacidade de agradar, a navegação anônima do meu browser ligada (por uma paranoia injustificada, uma vez que eu moro sozinho e pouco me importaria a opinião a meu respeito formada por um ladrão de computadores em potencial). Não devo tentar mexer na minha obra de ficção científica, que nasceu como uma tentativa dupla de sucesso (Conseguir um Pulitzer; Conseguir usar a arte como terapia), e duplamente frustrada pelo fato de que eu daria um péssimo Arthur C. Clarke (o que aumentou ainda mais a minha necessidade de terapia). E o campeão de todos os vícios para se evitar ao longo de uma licença médica devido à “febre do cubículo”: Não devo ficar lembrando-me de todos os meus relacionamentos passados ou hipotéticos, o primeiro tipo compreendendo aqueles consumados com mulheres que nunca teriam a capacidade de me agradar, e o segundo com mulheres que, na maioria das vezes, sequer existiam. Ou pelo menos, sequer existiam da forma como eu as idealizava.
Era o caso daquela bela escritora que conheci numa vernissage de abertura para uma exposição peculiarmente ruim. Eu achei que uma senhorita com aquele sorriso, que entendesse tanto de vinhos chilenos e literatura inglesa seria uma companheira requintada, com um olho clínico perfeito para uma boa oportunidade de relacionamento, que saberia temperar com muita calma um namoro intenso, vívido, cheio de cores e viagens. Que saberia se entregar e se conter na medida certa, jogando um jogo cooperativo, e não uma competição. Ela acabou sendo uma dominatrix com práticas sexuais absurdas e brinquedinhos assustadores, que odiava o fato de não conseguir se relacionar com outra coisa que não as criaturas odiáveis que são os homens, que ela realmente detestava. Ou então aquela contrabaixista de jazz linda, pequenininha e tímida que escondia, por trás daquele imenso corpanzil acústico de madeira e cordas, o fato de que ela tinha uma das mais potentes e doces vozes que o mundo da música esperava para conhecer. Ouvindo seu discurso dialético e bem-construído a respeito de como o mundo merecia ouvir mais krautrock e menos música eletrônica cheia de batidas, e sobre como os pais dela a levaram à Louisianna uma vez, quando ela era uma criança, e retornou ao Brasil cheia de sonhos e LP’s da Nina Simone... Ouvindo a canção quieta que seus olhos tocavam sobre o meu terno alugado (odeio ternos)... Eu me apaixonei ali, na convenção mesmo, e imaginei diversas noites nas quais nós, mamilos a conversar com o ar da noite, escutaríamos Sinatra e assistiríamos filmes antigos e misteriosos antes de dormir, doses de conhaque e sorvetes de amêndoas. O que eu não imaginei é que ela tomaria doses e mais doses de conhaque, e me trairia com o saxofonista quarentão pai de família antes mesmo do nosso primeiro encontro. Ou então...




(confira a continuação aqui! Ou seja um apressadinho e vá logo para a parte final do conto aqui, descontextualizando todo o final :D)

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